Fotógrafo lança livro do Led Zeppelin: “você não pode se achar da banda”
Neal Preston lança ebook com mais de 100 imagens inéditas da banda e fala sobre o distanciamento necessário no trabalho de fotógrafo
De cara, o nome “Neal Preston” pode não despertar nenhuma reação entusiasmada entre os fãs de rock. Procurar seu nome no Google resultará em fotos de Led Zeppelin, The Who, Pink Floyd, Bruce Springsteen, Elton John, Queen e quase nenhuma dele mesmo. Foi através de suas lentes que estes e outros nomes de uma lista incontável tiveram os auges de suas carreiras registrados em milhares de fotos que se tornaram tão lendárias quanto os próprios músicos.
Aos 61 anos, o fotógrafo norte-americano lança Led Zeppelin: Sound and The Fury, um e-book disponível na loja virtual iTunes com mais de 100 fotos inéditas do grupo britânico. São 312 páginas com imagens jamais publicadas, relatos do autor, entrevistas e áudios sobre momentos marcantes na história do quarteto, e claro, do fotógrafo.
Descontraído e cheio de simpatia Preston conversou com o Terra por telefone sobre sua vida na estrada com bandas icônicas e não teve receio ao reagir quando a reportagem revelou que “nem havia nascido” quando o fotógrafo veio ao Brasil com o Queen, em 1981: “vá se foder”.
Leia a entrevista:
Terra – É um jeito diferente de se lançar um livro, sendo que é um ebook.
Neal Preston – Você gostou?
Claro. É bom ver material inédito do Led Zeppelin em 2013. Como foi para você vasculhar esse material e reviver essas memórias e sensações?
Bom. São duas perguntas aí. Sobre as fotos, demorou um pouco porque tem muito material aqui. É um processo em que você precisa editar muita coisa. Eu sei quais fotos não foram publicadas e você precisa mostrar para os fãs algo inédito e separar algo para o futuro. Isso é algo interessante de se ter um livro digital. Podemos fazer atualizações e adicionar coisas novas. É divertido, porque você fica muitos anos sem olhar para as fotos. Quando olhamos para trás, sempre notamos algo que não vimos antes. Quando você vê as prévias, já repara em coisas que não tinha notado. É um processo divertido. Sobre as coisas que escrevo, são minhas memórias. Sempre fui um escritor frustrado. Grande parte dos meus amigos são escritores. Eu sempre quis escrever. Antes do livro, poucas coisas minhas foram publicadas, mas sempre foi divertido. Eu amo escrever e gostaria de ter escrito mais durante minha vida.
É um jeito diferente de se expressar quando se trabalha tanto com imagens.
Eu tenho muito orgulho das coisas que escrevo. Eu acho que é OK. Se eu não achasse, te diria que é uma droga.
Quer saber de uma coisa? Quando eu saio de férias, não levo minha câmera. Eu fico enjoado dela. É como ir ao escritório nas suas férias. Quando você vai em um show nas horas vagas, você não quer escrever, não é?
Por aí…
Posso te perguntar quantos anos você tem?
Claro. Tenho 28 anos.
Eu estava na América do Sul com o Queen na turnê de 1981.
Eu não havia nem nascido.
Bom…vá se f**der (risos).
Como foram suas passagens pelo Brasil?
Estive com eles no Rio de Janeiro e São Paulo, mas também estive no Rock in Rio e fui com o Bruce Springsteen. Shows incríveis. Você perdeu. Estive até no Chile, com o New Kids on the Block.
Algumas fotos bem memoráveis foram com o Queen. Quais são suas favoritas?
Bem, a famosa com Freddie Mercury em Wembley. Ele inclinado e o público ao fundo. Essa ficou bem conhecida. Adorava trabalhar com o Queen. Isso sim era uma festa.
Como era seu relacionamento com as bandas? É difícil trabalhar com astros do rock? Como estabelecia os limites profissionais e de amizade?
É uma questão interessante. A resposta é…não é fácil. Você sabe, estou lá para fazer um trabalho, e isso é o mais importante. Estar na estrada com Led Zeppelin, The Who, Queen ou Fleetwood Mac pode ser excitante, mas eu não estou lá para fazer festa, você não pode se achar da banda. Eu preciso fazer o trabalho e dar as fotos que eles precisam. Isso tem que ser prioridade. Toda banda tem uma personalidade diferente. Você precisa ser um camaleão. Não sei se a palavra serve em português…
Você precisa ser flexível.
Exato. A maior parte do tempo é bom senso. Quando eu entro na festa? E olha que não era tanto quanto você pensa. Quando fico calado? Quando tiro fotos? Quando guardo a câmera? Não existe manual de instrução para isso. É algo que se desenvolve ao longo do caminho.
“Você não pode andar por aí achando que é o quinto integrante do Led Zeppelin ou do Queen”
Neal Preston (sobre os limites de se trabalhar com bandas)
Como você sabia quando estava no local como fotógrafo ou como amigo? Como determinava seus acessos?
Com Led Zeppelin eu tinha acesso total. Eu podia ir onde quiser. Mas isso não quer dizer que você fotografa tudo o que vê. Às vezes sim, mas de vez em quando isso quer dizer que você pode tirar algumas fotos, mas elas ficarão em sua gaveta por um bom tempo. Você precisa ter um cérebro e usá-lo. Bom senso. É a parte mais importante desse trabalho, é mais importante inclusive do que tirar as fotos. Você não vai ser contratado se já não for um bom fotógrafo. Você precisa saber como vai se comportar. Você não pode andar por aí achando que é o quinto integrante do Led Zeppelin ou do Queen. Se você lidar assim com as coisas, rapidamente estará sozinho em breve. Eu tive meus momentos que não tenho orgulho. (risos)
Quais são suas fotos favoritas?
Certamente Jimmy Page tomando aquela garrafa de Jack Daniels, sabe? Sabe de qual estou falando?
Jimmy Page no backstage de um dos shows do Led Zeppelin Foto: Neal Preston
Sim.
Estava falando sobre ela esses dias. Para mim, essa foto é uma das maiores imagens que representam o espírito de backstage do Led Zeppelin. Confere?
(risos) É verdade. Se você tivesse tirado a foto, não faria diferença alguma. Ela ficou tão popular que é algo inacreditável para mim.
Só essa?
Tem também uma do Robert Plant segurando uma pomba branca. Foi um momento bonito. Freddie Mercury em Wembley. Bruce Springsteen, também em Wembley, com o público. São fotos que trazem emoção para quem as vê. Se as pessoas encontram algum sentimento nessas imagens, quer dizer eu fiz meu trabalho direito.
Em retrato de Neal Preston, Freddie Mercury se apresenta com o Queen no Estádio Wembley Foto: Neal Preston
Falamos de alguns êxitos de sua carreira, mas tem algum momento que você perdeu? Alguma foto que se culpa por não ter tirado?
Sim! Pra c******! Com o Led Zeppelin. Eu ia fazer uma foto deles para a capa da Rolling Stone. Era uma matéria do Cameron Crowe. A primeira capa deles para a revista. Eu os juntei no Hotel Plaza para uma sessão de fotos. A câmera quebrou e o filme simplesmente saiu. Meu coração ficou aos pedaços. E quer saber? Meu coração ainda está aos pedaços.
Até hoje?
Completamente. Eu poderia me matar até hoje por causa disso.
Então a foto para a capa não foi tirada?
Eles pegaram duas fotos de show. Uma do Jimmy e uma do Robert e as juntaram em uma imagem só. Era pra ser uma foto do grupo todo. Oh Deus, ainda me sinto triste por causa disso. Obrigado por fazer me lembrar desse episódio horrível. (risos)
Desculpe-me.
Isso acontece. Você aprende com isso. Você precisa ter backup. Você precisa ir com duas câmeras para fotografar um acontecimento como esse. Você não vai aprender isso na escola, você aprende errando.
Nessas excursões, você tinha noção que estava registrando parte da história da música?
Não. Não haveria uma forma de eu perceber isso. Eu estava tão preocupado com o meu trabalho que não conseguiria reparar isso. Quando comecei não havia “fotografia musical”. Era fotografia. Eu não tinha noção que fazia parte de um grupo que estava trilhando um caminho novo e criando um gênero de fotografia na música. Havia muitos fotógrafos que já trabalhavam com as gravadoras, mas a gente não tinha essa capacidade de compreender o que estava acontecendo. Estávamos trabalhando. E muito. Era algo que não refletíamos.
Vocês – músicos e fotógrafos – não conversavam entre si sobre o que estava acontecendo?
Lembro-me que estávamos em Madison, Wisconsin, perto de Milwaukee e Chicago, em uma turnê com Emerson, Lake & Palmer. Greg Lake, o baixista e vocalista, grande amigo meu, ficou muito bêbado. Muito bêbado. Estávamos em um hotel e ele subiu em uma mesa de centro e começou a gritar como eu era importante e o material que eu tinha seria lembrado para sempre depois de todos morrermos. Eu olhei para aquilo e pensei: “ele está completamente louco” (risos). Talvez tivesse um pouco de verdade naquilo. Eu não sei. Foi a primeira vez que alguém disse para mim que o que eu fazia era importante.
Qual é a importância de um fotógrafo musical hoje em dia? Acredita que ajudou a moldar o gênero? Agora todas as bandas andam com um fotógrafo a tiracolo.
As fotos que fiz de todas as bandas, mas principalmente do Led Zeppelin, ajudaram a criar o legado desses grupos e a registrar suas histórias. Algumas fotos são mais importantes do que outras, assim como algumas músicas são mais importantes do que outras. Tudo está ligado. O Zeppelin não aparecia muito na TV, sendo assim, suas fotos ganharam um valor muito grande. É como se você justificasse tudo o que fiz e ainda faço. Para os fãs que amam o Zeppelin, eles podem olhar esse livro e ver fotos inéditas que eles nunca veriam a não ser que estivessem em minha casa jantando. Há um número enorme de fotos do Led Zeppelin para serem vistas ao redor de todo o mundo, mas como vamos juntar todas elas? Eu sou um dos poucos que possui um acervo tão grande. Isso é algo que eu queria fazer aos fãs do Led Zeppelin que queriam ver essas fotos e jamais teriam a chance.
“Tire essa porra da sua cara e aproveite”
Neal Preston sobre fotografar shows com celulares
Como se sente abrindo esse acervo?
A parte importante é receber uma ligação ou um e-mail de alguém dizendo que ficou emocionado ao ver uma foto. Quando os fãs sentem algo, é isso que me deixa feliz. O que eu deveria fazer? Morrer e deixar todas as fotos na minha sepultura? Acho que não é a coisa certa a se fazer.
Acha que seria egoísmo?
A tecnologia evoluiu. Esse formato me proporcionou um jeito diferente de lançar um livro. Se eu tivesse feito um livro tradicional, ele teria 20 kg e custaria US$ 200. Agora podemos vender algo a um preço acessível e dividir coisas que as pessoas não veriam.
Para encerrar: a fotografia se expandiu. Hoje todos têm câmeras de alta qualidade nos bolsos e lentes profissionais nas lojas. O que você sente quando vê o público em shows com aquelas dezenas de celulares fotografando e filmando as bandas?
Eu não tenho um problema com isso. Você pode ter uma câmera, mas não significa que você é um fotógrafo. Eu posso comprar uma lousa e giz, mas não serei um professor. Você vê todos os pais em jogos de beisebol de seus filhos – vocês devem ter ligas de futebol por aí – filmando e tirando fotos, mas ninguém está assistindo. Todos estão preocupados em tirar uma foto de um show de rock, em vez de ter a sensação de estar em um. Você está perdendo o momento. Quem somos nós para dizer que essas pessoas não devem fazer isso? Todos têm uma câmera, mas eles não são fotógrafos. Tire essa porra da sua cara e aproveite.
Fonte: http://musica.terra.com.br
Dica de: Roberto Mercury