A melancólica “Um homem só” e “Boa companhia” atingem até algo próximo ao britpop, na maior guinada do disco. “O rock inglês do Queen e o de bandas australianas são referências, inclusive quando eu fiz o solo de ´Boa Companhia´, lembrei do Brian May, que pra mim é um dos melhores guitarristas do mundo, pra fazer um solo que coubesse bem na música”. Disse Passarell.
Abaixo a reportagem completa:
Com as novas parcerias entre Alvin L. e Dinho e as guitarras mais comportadas de Yves (em relação ao ´Gigante!´ e ao projeto histórico da Aborto Elétrico), o disco soa menos contundente e mais coerente com a sonoridade e as idéias do Capital de logo após sua volta, em 98, e até com algo menos visceral dos anos 80. Mas também mantém alguns riffões do ex-Viper em meio àquele ar melódico e melancólico que já alguns já atribuíram ter influenciado bandas emos. “Os riffs estão mais contidos. Esse disco é uma reafirmação do que é o Capital Inicial. O projeto do Aborto não tinha mais a ver com o Capital. O ‘Gigante!’ também era muito espetado. O Capital era o som que a gente estava fazendo nessas músicas. Esse disco quis dar uma desacelerada e se preocupar mais com cifras, com a sonoridade, com solos riffs, no caso da guitarra, muitos climas. É um disco mais calmo, até um pouco melancólico, mais do mesmo, o que é natural para uma banda com tantos anos. Procurar sua identidade é melhor do que ficar correndo atrás do novo, sempre com atraso”. Ditar tendências, na visão do guitarrista do Capital, agora cabe às bandas mais novas. Ao Capital, a missão é só dar uma retocada na sua própria musicalidade.
Passarell discorda que a presença do teclado de Robledo Silva em quase todas as faixas tenha interferido nessa sonoridade, apesar de lembrar que o instrumento só esteve presente, mais recentemente, no álbum “Rosas e Vinho Tinto” (2002). A faixa-título é mais balada, com voz e violão na primeira estrofe, numa letra despojada, com uma unidade bem legal. Dinho mais solto, como antigamente. “Aqui” segue essa linha mais sentimental, lenta, coerente, legal. A melancólica “Um homem só” e “Boa companhia” atingem até algo próximo ao britpop, na maior guinada do disco. “O rock inglês do Queen e o de bandas australianas são referências, inclusive quando eu fiz o solo de ´Boa Companhia´, lembrei do Brian May, que pra mim é um dos melhores guitarristas do mundo, pra fazer um solo que coubesse bem na música”.
Saudações a todos
Mesmo assim, Yves considera estes dois discos – “Rosas e Vinho Tinto” e “Eu nunca disse adeus” -os que são “mais Capital Inicial”, depois da volta. “As músicas pedem os instrumentos, o teclado entra no final para dar um clima mais calmo”, enfatiza. “O Imperador” e “Altos e baixos”, por exemplo, não pediam nada pesado. E olha que o disco começa com um punch forte, na juvenil “A vida é minha (eu faço o que eu quiser)”. Mas a sensação inicial só se repete em algumas outras faixas, como “18”, feita para um sobrinho de Dinho e que volta de vez aos riffs mais instantâneos. Até a citada “Boa companhia” é mais direcionada pra molecada. Mesmo assim o conjunto é muito acima de muita coisa da galera desta faixa – ou feita para a galera desta faixa. “Dormir“ usa um synt meio mântrico, balada mais direta, também adolescente, mesmo assim não propriamente baba. No meio termo, mas também mais próximo das coisas mais novas, é “Diferentes”.
Na seqüência, “Má companhia” e “Eu adoro a minha televisão” voltam ao rock mais tradicional do Capital, remetendo ao primeiro disco, falando de um certo egocentrismo, um isolamento da realidade e uma iconoclastia comuns aos jovens de hoje também, não apenas em relação à juventude não bronzeada de cidades como São Paulo e Brasília, como pode ter sido outrora. “Se você for se preocupar demais quem você vai atingir, ou como você vai atingir, você nunca vai atingir ninguém”. Desse jeito, “Altos e baixos”, “Eu e minha estupidez” ou “O Imperador” acabaram fluindo com uma elaboração maior, uma certa maturidade mesmo, que andava fazendo falta no rock do Capital. Um disco que volta ao passado, sem se perder das fórmulas mais diretas da trajetória mais atual da banda.
Sentimento e maturidade
Se neste novo disco jorram melancolia e sentimentos em vários contextos, isso não significa que o Capital guarde uma identificação com o movimento emo. “Não, não (risos). Bom, não tenho nada contra. Tem bandas muito boas, mas só algumas vão sobressair e podem depois seguir um estilo diferente, como aconteceu nos anos 80… Mas eu não vejo nenhuma banda parecida com o Capital. Acho interessante alguma se espelhar na gente, afinal essas bandas novas vão ditar o que vai acontecer daqui a dez anos. Mas essa sonoridade nossa já existia até nos anos 80, claro que antes tinha muitos teclados, na primeira fase”, escapa.
Por sinal, o Capital ainda vai continuar tocando as músicas antigas. Quem sabe o disco ajude a rever outras além de “Belos e Mald itos”. Continuando: “Que bom que algumas bandas tenham influência do Capital dos anos 80, mas eu acho que essa nova geração tem uma cara própria”. Algumas canções de “Eu nunca disse adeus” sugerem outros momentos para os adolescentes, mas com uma postura mais madura, até mesmo das letras e das músicas em si. “Claro que o rock geralmente afeta mais os adolescentes, mas isso é natural, a gente fala de coisas do cotidiano. Mas acho que as letras estão mais maduras sim. E as músicas foram pedindo outros elementos”. O Capital tenta, mais do que nunca, integrar gerações. A longevidade da banda e a universalidade do rock exigem isso.
“Essa geração dos anos 80 é a primeira que está sobrevivendo do rock´n´roll, no Brasil. Lá fora ninguém liga de que década é o Red Hot. No show vai a molecada, o cara mais velho, todo mundo. Aqui, queriam que a banda fosse fazer MPB ou tinha que ter o carimbo de alguém da MPB ou então continuar falando de política. O rock não precisa levantar bandeira. Nós fizemos isso, mas você pode diversificar. Falar sobre relacionamentos, sobre drogas, sobre o que acontece, também é uma forma de falar sobre a nossa sociedade. Como isso vai atingir a pessoa mais velha ou mais nova, você nunca vai saber. De qualquer forma, o rock é mais aberto do que as pessoas pensam”, argumenta Yves.
Essa universalidade não acaba também estimulando alguns estereótipos? “Até pode criar. É difícil escapar disso. Claro que você ouve uma ‘Natasha’, pensa que é sobre adolescente, é um estereótipo, mas o pessoal curte mesmo assim. ‘Altos e baixos’, nesse novo, fala sobre o próprio Capital, que teve grandes sucessos e grandes fracassos. Serve pra qualquer banda ou qualquer pessoa, faz parte da vida, serve pro adulto, pro adolescente”.
Representando um pouco isso, “O imperador” fala do declínio de um ídolo que “só queria ser amado e ter seu dia de verão”. Uma letra com trechos associados às trajetórias do próprio Capital, a Renato Russo e a Paulo Ricardo, embora o primeiro ainda esteja propenso a continuar com suas vestes reais. Mas o guitarrista do Capital abre os olhos da molecada. “O Capital, o próprio Viper são bandas que tiveram a fase do deslumbre, mas a música também pode servir para bandas mais novas, como algumas que já foram ao próprio Ceará Music”.
Fonte: http://tabajara.am.br/